sábado, 16 de outubro de 2010

Louvor de Deus: participação e Esplendor liturgicos.

Louvor de Deus: participação e Esplendor liturgicos.
Portadores do Carisma do Louvor de Deus, queremos como salvistas propiciar o encontro da pessoa com Deus e em primeiro lugar na Liturgia, por isso vemos na participação litúrgica, o caminho certo para que a vida de cada ser humana seja um Louvor de Deus, por isso a reflexão abaixo quer demonstrar a importância dessa participação e como a mesma é propiciada pelo Esplendor Liturgico.
A Constituição Sacrosanctum Concilium considera a participação dos fiéis como o principal objetivo da renovação conciliar da liturgia[1] (Cf. SC 11 e 14) A referida Constituição diz que o objetivo da reforma é que o povo cristão na liturgia consiga com mais segurança graças abundantes. Para isso, os textos e as cerimônias devem exprimir mais claramente o Mistério celebrado, para que o povo possa compreendê-las facilmente e também “participar plena e ativamente da celebração comunitária”. (SC 21)
Para obter a participação plena e ativa dos fiéis a Constituição propõe que a reforma do ordinário da missa.[2] Os sacramentais também seriam revistos em vista da participação consciente, ativa e fácil dos fiéis (Cf. SC 79). No mesmo sentido, a reforma do Ofício divino tinha a finalidade de provocar “consonância entre as palavras e seu espírito” (SC 90). Por fim tanto a música sacra, cantada por todos (cf. SC 121), bem como as construções de igrejas, primando pela funcionalidade (cf. SC 124), devem levar em conta a participação ativa dos fiéis.
A participação plena e ativa, ou simplesmente a participação, como processo de identificação com Jesus Cristo, pode ser analisada nos seguintes níveis:
-         Interior – participação no nível da psique, quando a ação externa toca a percepção interior, uma experiência do coração;
-         Exterior - corporal, sensível, a experiência litúrgica tem uma dimensão corporal;
-         Frutuosa – adesão vital a Jesus Cristo;
-         Consciente – o fiel compreende que Deus age pela ação ritual. [3]
A participação possui as dimensões interna e externa.[4] Sem o culto interno não haveria nenhum significado o culto externo, tal culto externo torna extrínseco e intensifica o culto interno, e demanda disposições de reta intenção ou de espírito reto. [5] 
A participação ativa dos fiéis é um direito e um dever baseado no batismo que esses mesmos fiéis receberam[6] e é desta participação plena e ativa “que os fiéis haurem o espírito verdadeiramente cristão” (SC 14). 
Para que a participação dos fiéis aconteça, os pastores devem estar “imbuídos do espírito e da força da liturgia e dela se tornarem mestres” (SC 14). Por isso, são exortados a formar o povo para a participação frutuosa na liturgia, segundo a própria condição do fiel.[7] Na formação, os clérigos e religiosos devem ser preparados para participarem da liturgia de “todo o coração (...) imbuídos do espírito da sagrada liturgia” (SC 17).
A Constituição sobre a liturgia declara que a “liturgia não esgota toda a ação da Igreja” (SC 9), porém “é o cume para o qual tende a ação da Igreja e, ao mesmo tempo, é a fonte donde emana toda a sua força” (SC 10). Após tal declaração, a Constituição afirma que a santificação dos fiéis é conseguida pela eficácia da liturgia, tal eficácia depende das disposições pessoais, pois, “para que se obtenha esta plena eficácia, é mister que os fiéis se acerquem da sagrada liturgia com disposições de reta intenção, sintonizem a sua alma com as palavras e cooperem com a graça do alto, a fim de que não a recebam em vão” (SC 11). Pois além de incentivar a participação ativa externa através de respostas, salmodias, as antífonas e cânticos (SC 30), a Constituição afirma que esta participação externa tem que despertar os fiéis para Deus e ser alimento interior deles.[8]
            Sob a ótica sócio-antropológica, uma religião se manifesta por atitudes exteriores que revelam atitudes interiores através de ações e gestos.[9] Assim a participação é a manifestação das disposições pessoais estruturadas dentro da celebração litúrgica. Tais disposições estruturadas são o habitus, que produz práticas com uma regularidade imanente às condições objetivas da produção de seu princípio gerador. Tais práticas podem ser  explicadas, quando se coloca em relação: o habitus (que engendrou as práticas) com as condições do exercício desse habitus, isto é, a conjuntura (estado particular da estrutura).[10]  
            Numa ótica etimológica, a participação (participatio, partem capere) não é somente um tomar parte, um captar algo, um compartilhar, de modo que poderíamos ter uma visão parcial. Um ritualista estaria participando? Mas participar é um associar-se pelo sentimento e o pensamento. É ser participante, isto é, corpo, sentimento e pensamento, imersos no Mistério Pascal celebrado. Por isso, neste trabalho a visão de participação é o encontro entre o ser humano e Deus na celebração litúrgica, [11] onde não entramos em contato com uma idéia, mas com alguém.[12] Neste tipo de celebração, o desejo salvífico de Deus e a instância simbólica do homem são os dois eixos fundamentais para a compreensão do encontro divino-humano, [13] na totalidade da pessoa, o corpo e as emoções.[14]   
            Neste encontro o gesto de amor de Cristo é pessoalmente ato do Filho de Deus que penetra no mais fundo de nossa liberdade, que se abre a ele.[15] Entretanto, o sujeito do sacramento, pela sua atuação pessoal, deve aceitar a natureza objetiva e a finalidade do sacramento. A atitude subjetiva do fiel há deixar absorver-se na estrutura objetiva do sacramento. O sacramento será frutífero na medida em que essa interligação acontecer.[16]  Este encontro é sinergia, isto é, união entre Deus e o homem em Cristo.[17]
            A Igreja anuncia a salvação ao ser humano, estrutura as disposições pessoais do fiel pela catequese e o torna sacerdote batismal, com direito e dever de ser participante na liturgia. Tais disposições pessoais são o princípio gerador da prática litúrgica do fiel. A participação (plena e ativa) acontece quando pela prática litúrgica da assembléia celebrativa juntamente com o presidente e outros ministros, estimulam o celebrante em suas disposições pessoais, a partir das próprias necessidades. Este estímulo faz o celebrante agir a partir do próprio interior em direção ao Mistério simbolizado, estabelecendo uma relação simbólica com Cristo e os outros celebrantes (comunidade celebrativa). Esta relação simbólica leva o celebrante a deixar-se absorver pela estrutura objetiva do sacramento numa entrega total (corpo, mente e sentimentos) ao gesto de amor do Cristo. Relação simbólica que é encontro, uma sinergia entre Deus e o ser humano (a graça), que tem por objetivo final a união e a identificação com Cristo. Esse processo participativo foi suscitado por Cristo em Emaús, ao estimular as disposições pessoais dos discípulos, culminando na convivialidade e tendo por conseqüência o anúncio dos discípulos aos apóstolos (ver quadro 6 no apêndice).
            Muitas vezes lemos na imprensa, escutamos ou sentimos, que fiéis não são tão fiéis assim, pois a eucaristia perdeu o sentido ou se transformou em programa de auditório para evitar a tristeza e o acabrunhamento dos discípulos de Emaús.
A ceia eucarística é o lugar de encontro com o Ressuscitado. Porém, para que esse encontro aconteça é necessário que as disposições pessoais estejam motivadas para uma participação eficaz. Numa visão sócio-antropológica, tomamos a ceia como jogo simbólico, no qual se realiza a relação simbólica entre os agentes, esses com as respectivas posições e disposições.  Neste jogo simbólico, com suas leis e regras, o fiel é convidado a participar do jogo a partir das suas próprias necessidades. São estas necessidades que provocam impulsos que são dirigidos e formados em direção ao Mistério simbolizado através do anúncio da Palavra e da catequese, estruturando assim as disposições pessoais. Assim o fiel está pronto para jogar. O fiel começa participar no jogo, quando numa celebração, os outros jogadores através do próprio estilo de comportamento motivacional e do engajamento na celebração do Mistério, estimulam cada fiel a se abrir ao diálogo com Deus. O jogo é assim: um estímulo motiva e dirige o interior do fiel participante a agir em direção ao Mistério simbolizado, estabelecendo uma relação simbólica com Deus e com a própria comunidade celebrante. Essa relação simbólica é encontro pessoal com Deus. O jogo simbólico objetiva a união entre Deus e o ser humano em Cristo Jesus (eficácia da liturgia).
            


[1] Cf. MARTÍN, Julián L. No espírito e na verdade: introdução antropológica à liturgia, p. 398. 



[2] Na reforma do Ordinário da Missa “apareça a índole própria de cada uma das partes, bem como sua mútua conexão e facilite a participação piedosa e ativa dos fiéis”. (SC 50)
[3] Cf. BUYST, Ione. Pesquisa em Liturgia, p. 27-28.
[4] Cf. CUVA, Armando. “Principi generali per la riforma e l’incremento della sacra liturgia”. In: La costituzione sulla sacra liturgia, p. 355. 
[5] Cf. Ibidem, p. 359. 
[6] Os batizados em Cristo “vivem o sacerdócio comum, que se manifesta na sua expressão máxima na celebração e de modo perene na vida ‘em espírito e em verdade’” TRIACCA, Achille M. Participação. In: Dicionário de liturgia, p. 901.
[7] Os pastores são encarregados “de vigiar que, na ação litúrgica, não só se observem as leis para a válida e lícita celebração, mas que os fiéis participem dela com conhecimento de causa, ativa e frutuosamente”. (SC 11) Os sacerdotes são convidados a assim instruir os fiéis na liturgia a fim promover “a ativa participação interna e externa dos fiéis, segundo a idade, condição, gênero de vida e grau de cultura religiosa”. (SC 19)
[8] “Enquanto a Igreja reza, ou canta ou age, é que se alimenta a fé dos participantes e suas mentes são despertadas para Deus, a fim de Lhe prestarem um culto racional e receberem com mais abundância Sua graça”. (SC 33)
[9] Cf. LAGENEST, J. P. Barruel de. Elementos de sociologia da religião, p. 15-16.  
[10] Cf. BOURDIEU, Pierre. Esboço de uma teoria da prática. In: Pierre Bourdieu, p. 65.
[11] Cf. SCHILLEBEECKX, Edward. Cristo sacramento do encontro com Deus, p. 176.
[12] Cf. SILVA, José Ariovaldo da. Liturgia, experiência da fé, Revista de liturgia, n. 141, p. 28.
[13] Cf. BOROBIO, Dionisio. Da celebração à teologia: que é um sacramento? In: BOROBIO, Dionisio (Org.). A celebração na Igreja. Vol. 1, p. 323. 
[14] Cf. GREELEY, Andrew. Simbolismo religioso, liturgia e comunidade, Concilium, n. 62, p. 187.
[15] Cf. SCHILLEBEECKX, Edward. Cristo sacramento do encontro com Deus, p. 83.




[16] Cf. RAHNER, Karl. Um novo sacerdócio, p. 168-171.
[17]  União entre a “energia do Espírito de Deus que embebe interiormente a energia do homem e o identifica com Cristo. Todo o realismo da liturgia e da divinização está nessa sinergia”. CORBON, Jean. Liturgia de fonte, p. 11.

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