sexta-feira, 1 de maio de 2020

TRANSPARÊNCIA COMO VIRTUDE


TRANSPARÊNCIA COMO VIRTUDE

            Padre Gilberto Maria Defina, sjs, fundador de nós, salvistas, insistia que para haver vida comunitária a virtude principal seria a transparência. E somente pode haver Louvor de Deus num coração verdadeiro e transparente. Na Sagrada Escritura não existe um termo equivalente, mas podemos deduzir de algumas passagens de termos como sinceridade, integridade ou veracidade.
            33Ouvistes também que foi dito aos antigos: Não perjurarás, mas
cumprirás os teus juramentos para com o Senhor. 34Eu, porém, vos digo: não jureis em hipótese nenhuma;
nem pelo Céu, porque é o trono de Deus, 35nem pela Terra, porque é o escabelo dos seus pés, nem por
Jerusalém, porque é a Cidade do Grande Rei, 36nem jures pela tua cabeça, porque tu não tens o poder de
tornar um só cabelo branco ou preto. 37Seja o vosso 'sim', sim, e o vosso 'não', não. O que passa disso vem
            Em Mt 5,33-37,  Jesus ao comentar sobre o juramento diz que não se deve jurar, o que se deduz a partir de 2 Cor 1,23 e Gl 1,20, que São Paulo toma a Deus por testemunha de sua vida, como um juramento, que não se deve jurar por qualquer motivo ou levianamente. O importante é o versículo 37, no qual diz que o nosso “sim” seja sim, e o nosso “não” seja não, portanto, pode acontecer que um “sim” não tenha lastro ou base no interior do ser humano, mas seja algo falso. A pessoa não está sendo transparente, mas sim um relacionamento fingido, no qual suas intenções não concordam com sua palavra ou atitudes, pois podemos mentir com nossas atitudes também.
            O contrário de ser transparente é ser hipócrita, falso, de modo que o modo como vivemos ou nos portamos não concorda com a decisão que tomamos no coração, simulamos para agradar alguém e não a Deus e sua verdade. Por isso, nos diz o profeta Isaías: “O Senhor disse: Visto que este povo se aproxima de mim e com a sua boca e com os seus lábios me honra, mas o seu coração está longe de mim, e o seu temor para comigo consiste só em mandamentos de homens, que maquinalmente aprendeu” (Is 29,13). Podemos nos portar como adoradores, ter atitudes de piedade fingida, ter nos lábios louvores maravilhosos, porém no coração tomar decisões totalmente distantes de Deus. Outra característica que nos afastam da transparência é a dubiedade, como nos diz a Carta de Tiago (Cf. Tg 4,8); ter uma alma dupla, dipsychos, coração rachado, de modo agimos por conveniência e não na verdade. É o que aconteceu com São Pedro e São Paulo, como nos relata a carta aos Gálatas, São Pedro permanecia com os cristãos gentios, porém quando chegava os que vinham da parte de Tiago, ele rejeitava os cristãos advindos da Gentilidade, São Paulo admoesta São Pedro sobre a sua não transparência ou dubiedade, assim nos conta São Paulo: “Mas quando vi que não andavam retamente segundo a verdade do evangelho, eu disse a Pedro diante de todos: se tu, sendo judeu, vives à maneira dos gentios e não dos judeus, por que forças os gentios a viverem como judeus?” (Gl 2,14)
            Exemplo de transparência também, é Natanael, como nos conta o Evangelho de João:


45Filipe encontrou Natanael e lhe disse: "Encontramos aquele de quem escreveram Moisés, na Lei, e os profetas: Jesus, filho de José, de Nazaré". 46Perguntou-lhe Natanael: "De Nazaré pode sair algo de bom?" Filipe lhe disse: "Vem e vê". 47Jesus viu Natanael vindo até ele e disse a seu respeito: "Eis um verdadeiro israelita, em quem não há fraude". 48Natanael lhe disse: "De onde me conheces?" Respondeu-lhe Jesus: "Antes que Filipe te chamasse, eu te vi quando estavas sob a figueira".

            Jesus elogia Natanael, porque ele foi autêntico, foi veraz, transparente, ele disse o que realmente ele pensava de Nazaré, que diante da Judéia era considerada uma realidade periférica, povo da terra. Outro exemplo é Jó. Jó em seu diálogo com Deus é franco e honesto, por isso Deus recrimina os amigos de Jó que não agiram na caridade e na verdade, não é a toa que no início do livro Jó é chamado de íntegro, isto é, um homem inteiro, e não dúbio, como os sacrifícios pediam animais sem defeito o ser humano deve ser inteiro no seu agir e não dúbio.
            Uma distinção necessária:

Nem falso
Nem violento
Salmo 11 (12)
2 Senhor, salvai-nos! Já não  um homem bom! *
Não há mais fidelidade em meio aos homens!
3 Cada um só diz mentiras a seu próximo, *
com língua falsa e coração enganador.
4 Senhor, calai todas as bocas mentirosas *
e a língua dos que falam com soberba,
5 dos que dizem: “Nossa língua é nossa força! *
Nossos bios são por nós! – Quem nos domina?”
=7 As palavras do Senhor são verdadeiras, †
como a prata totalmente depurada, *
sete vezes depurada pelo fogo.
Mt 22 – Dai a césar
15Então, retirando-se os fariseus, consultaram entre si como o surpreenderiam em alguma palavra.16E enviaram-lhe discípulos, juntamente com os herodianos, para dizer-lhe: Mestre, sabemos que és verdadeiro e que ensinas o caminho de Deus, de acordo com a verdade, sem te importares com quem quer que seja, porque não olhas a aparência dos homens.17Dize-nos, pois: que te parece? É lícito pagar tributo a César ou não?
Mt 5,21
21Ouvistes que foi dito aos antigos: Não matarás; e: Quem matar estará sujeito a julgamento.22Eu, porém, vos digo que todo aquele que [sem motivo] se irar contra seu irmão estará sujeito a julgamento; e quem proferir um insulto a seu irmão estará sujeito a julgamento do tribunal; e quem lhe chamar: Tolo, estará sujeito ao inferno de fogo.





            Ser transparente é não ser falso, como nos diz o salmo 12 acima, ter um coração enganador, que apesar de ter palavras bonitas a intenção é pérfida. O exemplo do Evangelho é claro, os discípulos dos fariseus queriam colocar Jesus numa armadilha, se Jesus falasse que era a favor de pagar o tributo ele seria chamado de colaborador do Império e se dissesse não, seria preso. Mas o que fica mais claro é o elogio dos hipócritas, dizendo que Jesus era verdadeiro e ensinava sempre a verdade, são palavras verdadeiras, porém a intenção é podre, isso é um caso clássico de não transparência. Ser transparente então, é falar a verdade “doa a quem doer”? Cuidado. Em Mt 5,21 fica claro, o chamar o irmão de tolo, pode ser algo mal, como assim? Como no judaísmo se dizia, não podemos tirar o sangue o irmão em público, quer dizer, humilhá-lo até ele perder a cor. Por isso, devemos ter o discernimento na transparência para não humilhar as pessoas, como adverte São Paulo em Rm 14, não é porque temos ciência que vamos diminuir as pessoas.
            Como atingir a transparência?
Hb 4,12 - Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais cortante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até ao ponto de dividir alma e espírito juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamentos e propósitos do coração.
            A Palavra de Deus, como espada de dois gumes, vai até o centro (cerne) da nossa decisão e vai mostrar se realmente está de acordo com o amor e a verdade de Deus, a Palavra vai formar a nossa forma de decidir. Ouro ponto também, é saber que estamos sempre na presença de Deus, e assim, não teremos um coração que vai criar jardins secretos, fingidos, mas saber que no mais profundo Deus nos vê, por isso o Salmo 139 é um remédio poderoso para sermos transparentes.
Salmo 139
Iahweh, tu me sondas e conheces: 2conheces meu sentar e meu
levantar, de longe penetras o meu pensamento; 3examinas meu andar e meu deitar, meus caminhos todos são
familiares a ti. 4A palavra ainda não me chegou à língua, e tu, Iahweh, já a conheces inteira. 5Tu me
envolves por trás e pela frente, e sobre mim colocas a tua mão.23Sonda-me, ó Deus, e conhece o meu coração!
Prova-me, e conhece minhas preocupações!24Vê se não ando por um caminho fatal e conduze-me pelo
caminho eterno.
Como também a Carta aos Hebreus nos diz que nada está oculto aos olhos de Deus.
Hb 4,13
13E não há criatura oculta à sua presença. Tudo está nu e descoberto aos olhos daquele a quem devemos prestar contas.

            Uma última palavra, em nome da transparência podemos também ficar nos expondo sem necessidade, nosso foro íntimo precisa ser respeitado, e deve ser revelado somente a quem de Direito, como por exemplo, nosso confessor.
            Peçamos a verdadeira transparência, no equilíbrio da Palavra, para que possamos amar sem fingimento (2 Cor 6,6).

A LIBERDADE E LOUVOR DE DEUS COMO FIM ÚLTIMO DO HOMEM

    INSTITUTO SUPERIOR DE FILOSOFIA E TEOLOGIA SÃO BOAVENTURA     DANIEL RIBEIRO DE ARAÚJO                   ...