sábado, 6 de outubro de 2018

Diaconia do Carisma do “Louvor de Deus”


Diaconia do Carisma do “Louvor de Deus”

            Há dimensões no serviço ao Senhor, seja através da Palavra, “a Evangelia”, pela qual somos formados interiormente pela Palavra ouvida para nos unirmos plenamente a Deus, seja através da latria, do serviço a Deus mais diretamente no culto pela “Liturgia”, e essa dimensão deve transbordar no serviço da caridade, numa verdadeira “Diaconia”, num serviço de amor e não de temores escravizantes, numa liberdade que traz a verdadeira alegria no coração.
            O carisma do “Louvor de Deus” também que tem seu fundamento primeiro no serviço da Liturgia. “O carisma do Instituto é o ‘Louvor de Deus’ sob todas as suas formas, a litúrgica em primeiro lugar” (Constituições n. 5), e também a Palavra é essencial ao carisma como dita as Constituições em seu número 28: “A Palavra de Deus proclamada na Liturgia e meditada na Lectio Divina é fonte principal e perene de oração”. Porém, muitas vezes se levanta a questão: “Isso também é da Igreja como um todo, qual é a especificidade do ser salvista? Tomamos “Louvor de Deus” por carisma, mas o que isso significa?” Numa linguagem bem simples: “Para que serve uma realidade eclesial que tem por carisma o ‘Louvor de Deus’?”
            Por isso, meditemos sobre a diaconia, sobre o serviço que brota da essência do carisma do Louvor de Deus, um serviço que levaria as pessoas a se encontrarem com Deus e assim serem salvas, por isso somos mais do que nunca “salvistas”. Não no sentido ideológico ou por outro lado de sermos causa de Salvação, pois só Deus salva, porém no mesmo sentido de como o sufixo é utilizado em várias profissões, somos agentes que buscam a salvação e a querem levar aos outros, nunca donos da salvação, mas servos do processo salvífico.
            Hoje, vivemos numa sociedade mundial que é muito pluralista, efervescente, numa sociedade que prima pela imagem e pela informação, e se vicia nelas. Sociedades enormes como a chinesa, que a menos de cem anos passou por crises de fome e desorganização social, hoje tem um crescimento econômico altíssimo. Sociedade europeia que também passou por uma guerra devastadora hoje está organizada e com uma qualidade de vida primorosa. Mesmo em áreas da América Latina, Ásia e África, que vivem intercursos de fome e falta de saneamento básico, tem populações que estão imersas em novas tecnologias da informação e vivem ao mesmo tempo buscando a imagem e a evidência social.
            Por outro lado, vemos nessas mesmas sociedades, em graus diversos uma perda do sentido da vida e a perda da busca do transcendente. Áreas como a antiga Alemanha oriental, ou países como a Escócia, ocorre um alastramento muito grande dos sem religião e ateus. Há um distanciamento das pessoas da busca do transcendente que transforme a vida para amar, mas quando há a busca de um transcendente é um fechamento numa idolatria da própria imagem ou da força e imagem de alguém. Busca-se uma segurança falsa, e de vazio em vazio, com tendência à depressão, ao suicídio e ao pânico, vende-se a alma por qualquer centavo. Um vazio que busca na sexualidade desregrada e até nas parafilias anestésico para esquecer a si mesmo.
            Chegou a hora, de como Jesus em Lc 10, 21, exultar no Espírito, e fazer com que os pequeninos sejam atingidos pelo Evangelho. Essas pessoas que se refugiam na idolatria da imagem, em amizades fúteis proporcionadas pelas redes sociais, precisam novamente aprender que “Laus Dei caritas est”. Aprender que o “Louvor de Deus” salva e as ensina o amor verdadeiro e que esse amor é salvação para si e para os outros.
            Como fazer isso? E como esse carisma pode ajudar nisso?
            Os nossos pais na vida religiosa são os monges e monjas, consagrados e consagradas, que no início do Cristianismo, criaram verdadeiros oásis de sentido, numa sociedade que estava dilacerada pelo fim do Império Romano. E como fizeram? Pela oração e pelo trabalho, tendo neles caminho para encontrar Deus e viver nele. Oásis de sentido de vida atualizando a Palavra de Deus na Liturgia e na Lectio Divina.
            Como herdeiros deles, hoje como salvistas queremos, na vida religiosa, atualizar essa salvação por uma Liturgia que alie tanto o latrêutico, o referente a Deus, com uma dimensão de acolhimento humano, que leva as pessoas a se expressarem e participarem numa Liturgia abertas à ação do Espírito Santo. Divino e humano num equilíbrio perfeito para as pessoas, cada uma, se entregarem a Deus sempre.
            Os nossos pais, primavam pela Lectio Divina, e essa tinha a Sagrada Escritura como centro, isso não mudará nunca. E a Sagrada Escritura está no centro da Teologia e da experiência contemplativa. Porém, viam nos Padres da Igreja os intérpretes primeiros e também se debruçavam sobre eles para buscar a Palavra de Deus. E nós hoje? Continuamos na mesma linha, nunca jogaremos fora a nossa herança. Porém, chegou a hora de ampliarmos a busca da Palavra, e ler a presença de Deus em tudo o que a humanidade hoje produz. A revolução de Santo Tomás de Aquino ao assumir Aristóteles na compreensão teológica foi uma abertura necessária e que tanto bem fez a Igreja.
            “Sim, esta é a vontade de meu Pai: quem vê o Filho e nele crê tem a vida eterna, e eu o ressuscitarei no último dia” (Jo 6, 40). O verbo ver nesse versículo é o verbo grego Theoreo, que significa observar, que mesmo tendo em sua etimologia as palavras “ver” e “deusa” (thea), queremos ter essa graça de contemplar, de ver Deus nas coisas e acontecimentos da vida. Chegou a hora de verdadeiramente chegar até os pequeninos do Reino, que anseiam por sentido na vida, de buscar uma contemplação de Deus nas artes, em tantas obras como canções várias, cantando o amor e a vida, literatura e a sétima arte, o cinema e em tempos de Youtube quanta proliferação de expressões que precisam de discernimento e buscar o que Deus está falando nessas expressões.
            Porque não buscar Deus e ver que a gratuidade vence e toca os corações transformando-os como em “A festa de Babette” (Dinamarca, 1987), o filme preferido do Papa Francisco. Ver em tantos filmes bons sobre santos e descobrir um itinerário místico de encontro com Deus e não somente buscar sinais maravilhosos. Como o poder da graça em Santa Josephina Baquita, ou a força da luta contra o mal e o anuncio da verdade perante o comunismo e depois no papado como em São João Paulo II (Karol: o homem que se tornou papa). Contemplar nos “Escritores da Liberdade” (EUA, 2007) a força do autoconhecimento e do amor ajuda as pessoas a crescerem como seres humanos, e muitos outros. E não somente em dramas, mas até em comédia, ver que Deus fala na fragilidade humana, como foi o grande Charles Chaplin, (“Tempos Modernos”, 1936; “O Grande Ditador”, 1940; ou delicadeza no trato humano “O Garoto”, 1921), e é tarefa nossa descobri-Lo em tudo isso. Também, detectar que não louvor a Deus, mas degradação do ser humano em muitos filmes que ensinam a dominação e o ódio e não que a “a glória de Deus é o homem vivo” (Santo Irineu).
            Nesse milênio que começa é preciso começar a contemplar Deus naquilo que nos é oferecido. Senão não conseguiremos evangelizar e nossa palavra se tornará vazia. Os itinerários de decisões humanas na sétima arte sempre atrairá, o herói que vence, o mal que é derrotado, a complexidade humana, o medo da morte e a vitória do amor, sempre levará o ser humano a pensar o que é a vida. E nós como cristãos e especificamente como salvistas temos por missão ver o que há de “Louvor de Deus” em tudo isso.
            Conhecia o Senhor apenas por ouvir falar, mas, agora, eu o vejo com meus olhos” (Jó 42, 5). Depois de tanto sofrimento e tantas perdas, diante do mistério do sofrimento e vendo que a Providência de Deus é maior que o nosso entendimento, Jó se rende e afirma que agora ele vê a Deus, agora seus olhos podem ver a Deus. Essa leitura de Deus na arte pode nos ajudar a ver que a ação de Deus supera o nosso entendimento e ajudar as pessoas a se sensibilizarem com a presença do Transcendente em suas vidas.
            “Laus Dei caritas est”, tudo isso para que encontrando Deus, transformados em nossas decisões pela graça de Deus, possamos ter ações verdadeiramente amorosas e assim livres e libertos, poderemos amar verdadeiramente e assim louvaremos ao Senhor pelas nossas ações. Seremos um “Louvor de Deus”.
            Nosso coração é um pequeno lugar, מקום קטן, nossa cela monasterial na qual encontramos Deus pela Sagrada Escritura, e pela contemplação dEle nos escritores sagrados, nos Pais da Igreja, e hoje no que o ser humano realiza de tão maravilhoso, levando tudo isso para Liturgia e dela recebendo a força e a graça do Espírito para viver o amor que nos vem do Senhor e amar como Jesus amou (cf. Jo 13, 34). Não fazemos e executamos o carisma, mas somos “Louvor de Deus”, conscientes disso queremos que cada ser humano o seja, pois para isso nascemos e é isso que não faremos somente mas seremos na Eternidade, pois, “com o fim de sermos para o louvor da sua glória, nós, os que antes havíamos esperado em Cristo” (Ef 1, 12).

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